Caruru Ameaçado: escassez e preço do dendê inviabilizam tradição

  • Correio 24h
  • 08 Set 2020
  • 12:33h

(Foto: Correio)

Quando chega setembro, um produto costuma ser o vilão dos carurus que alegram Cosme e Damião: o quiabo! Mas, como 2020 não está para brincadeira, uma outra matéria prima fundamental para os carurus está ameaçando de vez as tradicionais homenagens que todos os anos acontecem no mês dos santos gêmeos ou, no caso do candomblé, os ibejis. O dendê, que enfrenta uma escassez nunca antes vista na Bahia, teve seu preço aumentado em mais de 140% no último mês, o que vai reduzir e muito a produção do caruru, seja ele de preceito religioso ou não.


 

Aliado a isso, a impossibilidade de aglomerar também vai contribuir para não haver confraternizações regadas a comida baiana. Ou seja, o aumento de consumo de dendê, que, segundo os distribuidores, chegava a 30% em setembro, deve cair.

A cozinheira e baiana de acarajé Angelimar Trindade Sousa costuma fazer carurus de encomenda e já percebeu que esse ano a coisa vai ser fraca. Primeiro porque as pessoas não vão se reunir em suas casas. Segundo porque os preços das matérias primas da iguaria, especialmente o dendê, estão os olhos da cara.

"Vai ser um mês de setembro fraco para caruru, infelizmente. O preço do dendê subiu demais. O camarão também. São dois elementos que não podem faltar. E nos dias próximos a São Cosme e Damião o preço do quiabo também triplica de valor", observa Angelimar. Todos os anos ela recebia algumas encomendas, uma delas para 50 pessoas. 

Dessa vez, essa mesma encomenda vai ser para apenas 20 pessoas e as quentinhas de caruru serão entregues nas casas. Ou seja, os "convidados" vão receber a iguaria nas residências. "Vou fazer e entregar delivery. O número de encomendas diminuiu bastante e as que confirmaram eu vou levar as quentinhas até as pessoas", explica Angelimar.

Se estivéssemos em um ano normal, certamente muita gente já estaria prevendo fazer ou marcar presença em um caruru. "Normalmente caruru você convida uma pessoa e aparece cem. Isso ninguém vai poder fazer esse ano. Essa época você já tava ouvindo dizer: 'vai ter o caruru de fulano, de beltrano e de sicrano'. Esse ano não tô ouvindo dizer nada", observa a cozinheira. Mas, quem faz caruru de preceito não vai deixar de homenagear os gêmeos e ajudar a população carente, ainda que em menor quantidade.

Dos principais distribuidores de azeite de dendê na Bahia, a empresa Sabor Baiano confirma que o óleo de palma que é produzido no Pará continua chegando em poucas quantidades. Isso porque boa parte da produção paraense tem sido usada para o mercado interno e até para exportação. Marcos Parente, proprietário, diz que em setembro o aumento das vendas costumava ser de cerca de 30%, o que aconteceria entre o meado e o fim do mês. Ele diz não ter certeza se vai ter dendê para a demanda de setembro, ainda que essa seja reduzida. 

"A vendagem do azeite aumenta uns 30% em setembro. Não sei dizer se vai chegar a faltar porque dependemos da situação do azeite feito no estado do Pará. Tá chegando muito pouco, por isso os preços não vão baixar a curto prazo. Lá tem azeite, mas a exportação e venda para Petrobras são prioridades. Então são fatores que não temos controle", explica Marcos. 


Comentários

    Nenhum comentário, seja o primeiro a enviar.