10 anos da Lei Maria da Penha

  • Por Dr. Cleio Diniz
  • 11 Ago 2016
  • 11:01h

(Foto: Laércio de Morais | Brumado Urgente)

A lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006, popularmente conhecida como Lei Maria Da Penha, diferente do que muitos entendem em ser um benefício a mulher que contraria o princípio da igualdade do artigo 5º da Constituição Federal, e em consonância com um dos princípios basilares do direito e alicerce do sentido das leis, ou seja, o de “tratar os desiguais de forma desigual para que se tornem iguais”, coíbe e previne a violência familiar, a qual era jogada na vala comum do direito, e por ser considerada de menor potencial ofensivo, pelo menos inicialmente na origem das agressões, era fadado a cair no esquecimento e compor as fileiras da impunidade.

Para melhor entendimento, a lei nasceu após Maria da Penha Maia Fernandes, (a quem foi concedido o nome em homenagem), uma brasileira e farmacêutica, que sofreu várias agressões, inclusive duas tentativas de homicídio que a deixaram paraplégica, todas promovidas por seu marido, um professor universitário. Incansavelmente lutou por seus direitos, onde após ver o processo contra seu agressor ser manipulado pelo sistema processual falho e letárgico conseguiu contato com duas organizações – Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e Comitê Latino Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM) – que ajudaram a levar seu caso para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), sendo que o Estado Brasileiro foi condenado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica contra as mulheres.

 

Ao Estado Brasileiro foi recomendado a finalização do processo penal contra o agressor de Maria da Penha com as devidas medidas, além de instauração de investigação sobre atrasos e irregularidades em processos da mesma natureza, além da adoção de políticas públicas voltadas à prevenção, punição e erradicação da violência contra a mulher. Nascendo a partir deste momento, a Lei Maria da Penha.

Até este momento, muitas mulheres tinham medo de denunciar seus agressores. Pelo menos três fatores colaboravam para isso: 1) dependência financeira do agressor; 2) muitas vítimas não têm para onde ir, por isso preferiam não denunciar seus agressores por medo de sofrer represálias piores ao fazer a denúncia; e 3) as autoridades policiais muitas vezes eram coniventes com esse tipo de crime.

Uma pesquisa realizada entre as mulheres em geral, mostra o grau de seriedade do problema e a importância do tratamento direcionado pela lei como modo de saneamento da questão, e neste capo, a violência familiar não se restringe a agressões físicas com lesões aparentes. Diante de 20 modalidades de violência citadas no momento da entrevista, duas em cada cinco mulheres (40%) já teriam sofrido alguma, ao menos uma vez na vida, sobretudo algum tipo de controle ou cerceamento (24%), alguma violência psíquica ou verbal (23%), ou alguma ameaça ou violência física propriamente dita (24%).

O gráfico abaixo nos permite um melhor entendimento do panorama da situação:

Isoladamente, entre as modalidades mais frequentes, 16% das mulheres já levaram tapas, empurrões ou foram sacudidas, 16% sofreram xingamentos e ofensas recorrentes referidas a sua conduta sexual e 15% foram controladas a respeito de aonde iriam e com quem sairiam. Aliás, temos que lembrar que no âmbito da Lei Maria da Penha não encontra tutelado apenas o direito da Mulher, mas de toda a família em si, incluindo filhos e parentes que residente e compõe o ambiente familiar.

Algumas mudanças foram implantadas para melhor adequar a aplicação da lei, inicialmente a mulher podia retirar a queixa na própria delegacia, o que ocorria em razão de ameaças, falsas promessas ou outros subterfúgios promovidos pelo agressor, todavia em uma primeira alteração, o STF entendeu que o crime de violência doméstica constitui delito de ação penal pública incondicionada, ou seja, não depende de representação da vítima, qualquer pessoa pode noticiar o crime e a autoridade competente deverá dar o devido andamento, e a parte agredida não poderá retirar a queixa, sendo que o processo somente poderá ser extinto por um juiz no transcorrer da ação penal, o que impede a intervenção do agressor na possível extinção da queixa.

Neste processo evolutivo da legislação, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 7/2016, o qual busca conferir maior celeridade na proteção da mulher agredida e afaste um dos principais receios ao apresentar a queixa, ou seja, a retaliação pelo agressor, ao conferir a Autoridade Policial que preside o Inquérito a possibilidade de conceder medidas protetivas além de atendimento a mulher agredida de forma que coíba a inibição por vergonha de exposição.

Em síntese, apesar das críticas embasada em formalidades do conjunto normativo de nosso sistema jurídico, a Lei Maria da Penha foi um dos grandes avanços da nossa legislação, e apesar de em alguns casos remotos se depararem com problemas ocasionados por deficiência do sistema tem demonstrado um marco em nossa seara legal e um porto seguro às pessoas agredidas no ambiente familiar e que antigamente tinham que se submeterem a tais agressões ou em regra ver seus esforços por justiça se perder nas mazelas do sistema. Um avanço social no contexto literal e que atingiu seu objetivo de forma impar.

 


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